domingo, 23 de agosto de 2015

Memórias

Escrito em 23 de agosto de 2013...
Uma das virtudes que sempre reconheci a minha mãe foi a sua capacidade de lutar por uma vida melhor, e a sua "independência. Foi assim que apesar de meu pai ter morrido aos 39 anos, nunca cruzou os braços e conseguiu ganhar a sua vida através de muito trabalho. A idade não perdoa e por vezes as doenças tornam-nos frágeis e até dependentes ou mesmo totalmente dependentes. Apesar de ser diabética e de fazer diálise, minha mãe nunca se deixou vencer. Talvez hoje a minha mãe foi vencida... Talvez hoje a sua capacidade de lutar esfumou-se... Talvez hoje a sua independência seja perdida.
Mãe presto-te a minha homenagem por tudo o que ensinaste! Mãe apesar de todas as adversidades que viveste continuas viva embora hoje tenhas sofrido um rude golpe.
Presto-te assim a minha homenagem, apesar de saber que nunca irás tomar conhecimento dela. Mas também não me importa. Importa-me sim sentir que foste tu, mãe, que me deste a vida e que eu fiz com ela bem ou mal, mas foste tu que ma deste. Obrigado mãe por tudo o que deste.


P.S. - Minha mãe faleceu em 12 de Setembro de 2016

Deixo-te este poema de Eugénio de Andrade
Poema à Mãe
No mais fundo de ti
Eu sei que te traí, mãe.
Tudo porque já não sou
O menino adormecido
No fundo dos teus olhos.
Tudo porque ignoras
Que há leitos onde o frio não se demora
E noites rumorosas de águas matinais.
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
São duras, mãe,
E o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
Que apertava junto ao coração
No retrato da moldura.
Se soubesses como ainda amo as rosas,
Talvez não enchesses as horas de pesadelos.
Mas tu esqueceste muita coisa;
Esqueceste que as minhas pernas cresceram,
Que todo o meu corpo cresceu,
E até o meu coração
Ficou enorme, mãe!
Olha - queres ouvir-me? -
Às vezes ainda sou o menino
Que adormeceu nos teus olhos;
Ainda aperto contra o coração
Rosas tão brancas
Como as que tens na moldura;
Ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
No meio do laranjal...
Mas - tu sabes - a noite é enorme,
E todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
Dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves.
Eugénio de Andrade

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